Sabe essas merdas que o pessoal idiota costuma postar em redes sociais falando coisas como "Sua inveja me fortalece", "Inveja é não suportar ver o outro brilhar" ou então aqueles carros podres como Kadett carcomido pela ferrugem ou Corcel II branco que está mais amarelado que roupa branca de batizado de marmanjo com adesivos do tipo "Inveja é uma merda"?
Todo mundo quer pagar pau de superiorzinho do tipo "Ui! Eu não sinto inveja dos outros, os outros é que me invejam!".
Vão se fuder, de boa. Tratam a inveja como um câncer no caráter de uma pessoa, como se fosse tipo uma lepra ou queimadura ou necrose extensa ou algo do tipo, algo feio de se ver, mortal, ruim e nojento. E mais: algo que você, como narrador em primeira pessoa da história de sua vida, nunca admite possuir.
Não vou negar que ela seja ruim. Inveja é mesmo uma merda. Mas de boa: A MAIORIA DE NÓS A SENTE.
É verdade, é verdade: eu sinto MUITA inveja. Mas a diferença é o que eu faço com ela. Não vou aloprar a pessoa de quem sinto inveja, nem procurar fazer mal a ela de alguma forma, nem tentar tomar dela aquilo que eu invejo, mesmo porque o que eu costumo invejar não pode ser tomado, é imaterial, insubstancial e mesmo assim tão real quanto um murro na cara.
Não sinto inveja de posses ou coisas materiais. Não sinto inveja de viagens ou relacionamentos. Sou bem resolvida com relação a isso, com relação a minha pobreza material. O que me causa inveja é ver como uma pessoa é querida por um grupo e eu não. Ver como todos se preocupam com ela, como a convidam para fazer coisas, como a ajudam, como fazem questão de estar com ela e fazer dela alguém incluso... e o mesmo grupo não se lembram de mim nem para me desejar um feliz aniversário que seja.
Não sou uma vaca em querer que a pessoa deixe de ser popular e querida. Eu apenas passo a odiá-la em segredo porque na verdade eu queria ser como ela e não tenho capacidade de ser. Sou uma pessoa complicada, fechada, intimista, retraída, quase autista em inúmeros aspectos. E paradoxalmente desesperada por inclusão e amor das pessoas.
O foda é que depois de tanta terapia nessa vida a gente acaba se vendo como é: um monstro sob inúmeros aspectos - e isso pode ser bom ou uma merda, dependendo do dia ou da intensidade da TPM. Hoje me vejo como uma espécie de gárgula monstruoso e triste e cheio de ódio. Porque eu sei que estou errada em sentir o que sinto. Sei que a pessoa de quem sinto inveja não tem culpa nenhuma e que a culpa na verdade reside em mim por não saber me aceitar como sou.
Não vou armar estratagemas alucinantes e planos de destruição de vida ou caluniar ou foder com a vida da pessoa. Mas o fato é que tenho antipatia natural por qualquer pessoa que se destaque de qualquer forma. A pessoa fez sucesso em um grupo do qual faço parte? Ela chama a atenção (mesmo que por coisas boas)? Ela é querida porque é uma pessoa legal, dinâmica, participativa, engajada, otimista, divertida, simpática? Pronto... eu passo a odiá-la imediatamente porque eu não consigo ser assim e são pessoas assim que o grupo gratifica e integra... mas como disse, me seguro, porque sei que esse ódio é fruto da minha inveja, decorrente do fato de eu desejar ser como ela e simplesmente não poder ser.
Consigo lidar bem com minha pobreza material mas não com minha pobreza em termos de socialização (me recuso a chamar isso pobreza de espírito, como disse não sou uma puta a ponto de dar vazão aos meus entimentos e os mantenho enjauldos em meu coração, se debatendo e gritando dentro de mim). O grupo não gratifica pessoas como eu, e isso é um fato, não importa se é certo ou errado, se eu gosto ou não.
Então o que fazer com essa culpa? Sim, culpa. Porque é culpa o que sinto logo após deixar a inveja me tirar do sério e me arrebatar por uns tempos em um caos interno terrível. Culpa de sentir o que senti e ter sofrido a toa com essa merda, porque no final a única pessoa prejudicada com isso fui eu mesma.
Posso mudar quem sou? Tem dias que eu acho que sim e dias que eu acho que não - e os dias em que acho que não estão cada vez mais comuns. Mas se eu conseguir enfiar na minha cabeça de verdade que tudo bem em ser quem sou, e que as consequências serão essas (ser impopular) e beleza, toca a vida em frente nessa toada, então eu com certeza serei uma mulher mais feliz.